G8 e G20<br>e a crise capitalista

Albano Nunes

Há pro­fundas di­ver­gên­cias quanto ao modo de en­frentar a crise

Rea­li­zadas num quadro de apro­fun­da­mento da crise ca­pi­ta­lista e de grande ins­ta­bi­li­dade e in­cer­teza nas re­la­ções in­ter­na­ci­o­nais, as ci­meiras do G8 e do G20 re­cen­te­mente re­a­li­zadas no Ca­nadá me­recem atenção.

 

Quem pen­sava que a crise tinha en­ter­rado o G8 (de facto o G7 das po­tên­cias ca­pi­ta­listas mais po­de­rosas do mundo com a Rússia em po­sição su­bal­terna) e o G20 se tinha tor­nado a prin­cipal ins­tância de ar­ti­cu­lação in­ter­na­ci­onal ao ser­viço do im­pe­ri­a­lismo, en­ganou-se re­don­da­mente. Tal como o FMI e o Banco Mun­dial, em­bora pro­fun­da­mente de­sa­cre­di­tados, con­ti­nuam a pon­ti­ficar na «go­ver­nação» do sis­tema ca­pi­ta­lista e a im­pul­si­onar as mais agres­sivas ori­en­ta­ções ma­cro­e­co­nó­micas contra os tra­ba­lha­dores e contra os povos, assim o G8 se mantém para já como ins­tância de con­cer­tação do centro im­pe­ri­a­lista, pro­cu­rando ate­nuar e di­rimir con­tra­di­ções e pros­se­guir os in­te­resses ge­rais do grande ca­pital. Foi o que acon­teceu uma vez mais na ci­meira de Mus­koka em 25/​26 de Junho, uma ci­meira re­la­ti­va­mente dis­creta, in­de­cisa e pobre de de­ci­sões quanto à crise eco­nó­mica, mas lan­çada para a frente em ma­téria de mi­li­ta­rismo e in­ter­ven­ci­o­nismo agres­sivo. A es­ca­lada contra o Irão e contra a RPD da Co­reia foi ob­jecto de re­so­lu­ções ame­a­ça­doras, o que é tanto mais in­qui­e­tante quando tal coin­cide com enormes mo­vi­men­ta­ções de forças aéreo na­vais dos EUA (e de Is­rael) a ca­minho do Golfo Pér­sico.

 

Quanto à ci­meira de 27 de Junho do G20 – um es­paço de ar­ti­cu­lação mul­ti­la­teral que é ex­pressão do de­sen­vol­vi­mento de­si­gual do ca­pi­ta­lismo e do pro­cesso de re­ar­ru­mação de forças em curso na arena mun­dial, e onde a China e ou­tros «BRIC» de­sem­pe­nham papel cres­cente –, o que salta à vista são pro­fundas di­ver­gên­cias quanto ao modo de en­frentar a crise e a agu­di­zação das con­tra­di­ções tanto entre os cha­mados países emer­gentes e as grandes po­tên­cias im­pe­ri­a­listas, como entre estas. Unidas pelos mesmos in­te­resses de classe e par­ti­lhando os mesmos ob­jec­tivos es­tra­té­gicos – in­ten­si­fi­cação da ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores, re­co­lo­ni­zação pla­ne­tária, ataque a li­ber­dades e di­reitos fun­da­men­tais – e de­ci­didas a impô-los pela força mi­litar e pela re­pressão po­li­cial, di­vergem e con­fli­tuam na luta por mer­cados, fontes de ma­té­rias primas, es­feras de in­fluência. Foi o que acon­teceu quanto à de­fi­nição de pri­o­ri­dades e o modo de lidar com os gi­gan­tescos dé­fices es­ta­tais ge­rados pelas bi­li­o­ná­rias in­jec­ções de ca­pital no sis­tema fi­nan­ceiro. A Ale­manha joga na con­so­li­dação or­ça­mental e na de­fesa da sua po­sição de grande po­tência ex­por­ta­dora. Os EUA pre­tendem so­bre­tudo que esta alargue e abra o seu mer­cado in­terno e opõem-se a me­didas que ex­po­nham a men­tira da «re­cu­pe­ração» da eco­nomia norte-ame­ri­cana: os EUA, onde o de­sem­prego é su­pe­rior a 10%, e que con­tinua a viver à custa de um gi­gan­tesco en­di­vi­da­mento ex­terno e dos pri­vi­lé­gios do dólar, en­ca­minha-se para uma forte queda do PIB na se­gunda me­tade do ano. A carta de Obama aos seus par­ceiros do G20 nas vés­peras da ci­meira é a este res­peito muito sig­ni­fi­ca­tiva.

 

Ana­li­sando a si­tu­ação in­ter­na­ci­onal, a reu­nião do Co­mité Cen­tral de 27/​28 de Junho con­si­derou que a par do apro­fun­da­mento da crise ca­pi­ta­lista e da vi­o­lenta ofen­siva do grande ca­pital cresce a re­sis­tência e a luta em nu­me­rosos países, sendo de as­si­nalar na Eu­ropa, em­bora ainda muito aquém do ne­ces­sário, ac­ções sin­di­cais e po­pu­lares de grande di­mensão. In­ten­si­ficar e fazer con­vergir numa mesma cor­rente tais ac­ções é o ca­minho ne­ces­sário para im­pedir que sejam os tra­ba­lha­dores a pagar a crise e para de­fender di­reitos e con­quistas al­can­çadas por muitas dé­cadas de duras lutas. A vi­sita à Grécia da de­le­gação do PCP di­ri­gida pelo ca­ma­rada Je­ró­nimo de Sousa, para lá do sempre en­ri­que­cedor in­ter­câmbio de in­for­ma­ções e ex­pe­ri­ên­cias, in­sere-se nesta pers­pec­tiva de re­forço da co­o­pe­ração e so­li­da­ri­e­dade in­ter­na­ci­o­na­lista dos co­mu­nistas e de todas as forças anti-im­pe­ri­a­listas.       



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